Por Mazinho Bender

Em 2003 quando estive pela primeira vez em Carmo do Rio Claro fiquei impressionado com a singularidade da Serra da Tormenta e desde então tive vontade de ir lá em cima de bike, mas os anos passaram e então consegui agendar para o feriado de finados de 2006 uma viagem até lá.

Convidei os amigos, mas por motivos diversos todos (exceto o Zé Fevereiro) arregaram, azar deles que perderam passeios inesquecíveis. Partimos para lá na quarta a tarde para aproveitar o feriado desde o começo. Seriam quase 400 km, pareciam ser muitos, mas com estradas tranqüilas fizemos a viagem e menos de 4 horas, entretanto quando lá chegamos caía uma tempestade de fim de tarde, isso pelo menos deixaria as estradas com menos poeira.

Acordamos cedo na quinta-feira e continuava chovendo, chii... achamos que os passeios estariam comprometidos. Tomamos café e ficamos na espera de o tempo melhorar, mas lá pelas nove e meia a chuva continuava, isso deixariam as estradas com muita lama, então pensamos que se a chuva desse uma trégua iríamos até Conceição da Aparecida e voltaríamos, tudo por asfalto. A chuva parou por volta das 10:30h. e resolvemos partir.

O caminho até Conceição da Aparecida tem várias subidas, das que ficam no trecho de rodovia, uma delas é meio longa, depois que saímos da rodovia e seguimos a estrada(também asfaltada) para chegar à cidade, temos uma pequena descida no começo e depois é só subida até lá. São uns 5 quilômetros, mas com inclinação bem maneira.

Ainda na rodovia eu ia observando as estrada de terra que desta partiam e não pareciam estar muito enlameadas, nestas observações notei que talvez houvesse alguma opção de terra na volta, mas ao chegar em Conceição da Aparecida com a permanência de um tempo bom resolvemos encarar o desconhecido e fazer um caminho de volta pela terra. Como eu tinha no GPS alguns trajetos de viagens de carro feito na região, decidi encontrar uma nova via para chegar num deste e descer pela Serra da Mata. Isto nos levaria até a rodovia da ida à poucos quilômetros da pousada. Atravessamos a cidade em busca de uma saída de terra, a que encontramos, logo se mostrou incorreta indo em direção não condizente com nosso objetivo. Observando ao redor avistamos outra estrada que enveredava serras adentro indo na direção desejada, então voltamos para a cidade e seguimos a tal estrada.

Subimos uns quatro quilômetros até encontramos uma bifurcação, a estrada principal seguia uma direção não muito favorável, enquanto a estrada secundária parecia mais viável. O Zé Fevereiro não estava num dos seus melhores dias, reclamando que as pernas estavam sem forças, eu por minha vez estava animado e com tudo em cima, para desespero do Zé optei em seguir a estrada principal até o fim da serra para ter uma visão mais ampla dos caminhos. Chegando lá confirmou-se que a opção pela estrada secundária era a que deveríamos seguir, voltamos e entramos nela e para apimentar a navegação encontramos de cara outra bifurcação. Nosso objetivo era bem visível e identificado: duas casas no alto da serra do outro lado do vale. A via da direita descia forte para o fundo do vale enquanto a via da esquerda ia seguindo a encosta da montanha que formava o vale, ambas tinham o mesmo potencial para nos levar até lá. Optamos pela direita por ser uma descida bem convidativa e por seguir mais diretamente para um trajeto indicado pelo GPS.

A estradinha passando por pequenas fazendas ia nos levando em direção ao referido trajeto indicado no GPS, mas notamos que não escaparíamos de subir a encosta do vale. Quando estávamos à uns 500 metros do trajeto indicado pelo GPS, a estradinha entrou em uma fazenda, onde havia uma porteira e próximo dali uma casa de colono com várias pessoas, então resolvi perguntar se esta estrada tinha saída, mais como um pedido de permissão para passar, pois perguntar sempre tira a emoção quando estamos navegando.

Atingimos a estrada plotada pelo GPS, agora com menos emoção seguimos em direção a encosta da serra, logo de início a subida me pareceu bem pesada, pois estava na buzolina e segunda atrás e o esforço era grande, mas ainda dava para ir e continuei assim até um mata-burro, parei para esperar o Zé e tirar umas fotos. Quando voltei a pedalar estava atrás do Zé, então notei que ele estava girando mais do que eu e em uma marcha mais pesada, como isto era possível se nossas marchas são iguais? Olhei para o meu cassete e vi a corrente na 5ª marcha, mas o grip-shift indicava 2ª. Parei e ao verificar os cabos notei que o último conduite estava fora do lugar, deduzi que estava assim desde os primeiros quilômetros do passeio, quando minha corrente quebrou e este deve ter escapado durante o conserto, mas o interessante é que as marchas continuaram indexadas e desta forma não percebi o problema. Isto mostra que nem sempre usamos marchas leves por necessidade real e sim por necessidade psicológica.

Chegando quase ao alto da Serra da Mata passamos por uma bifurcação, a qual me dava a impressão de que seria a opção que viria da estrada que margeava a serra, com a curiosidade estimulada decidi naquele momento que o passeio do dia seguinte seria por esta direção incógnita. Logo depois já no alto da serra avistamos ao longe a cidade de Carmo do Rio Claro de um lado e a cidade de Conceição da Aparecida do outro, mas a descida neste início não era plena e tivemos alguns trechos em subida para finalmente curtimos dois quilômetros serra abaixo, mas lá no fundo não deixamos de sentir a angustia de saber que íamos subir tudo isto no dia seguinte.

Terminamos o dia satisfeitíssimos com os 40 km de desafios morros acima e abaixo, visuais lindíssimos e pouco barro.

Sexta-feira amanheceu... chovendo. De um lado a esperança de que a chuva parasse como no dia anterior, do outro a possibilidade quase certa de que o barro estaria presente em nosso caminhos. A chuva demorou um pouco mais para passar e acabamos saindo por volta das onze horas e quatro quilômetros começamos a subir a Serra da Mata, não havia barro, mas o piso encharcado exigia bastante esforço, vencido os dois primeiros quilômetros, o resto foi fácil, mas o barro aparecia em alguns trechos e começava a chegar no ponto "chiclete".

Passamos pela bifurcação no alto da serra e enveredamos pelo desconhecido. Minha intenção seria seguir uns 20 e poucos quilômetros em direção oeste e então virar para norte e encontrar uma estrada paralela para voltar, tudo isto baseado em observações na fotos do Google-earth e uma plotagem de rascunho no GPS.

Para deixar as coisas mais emocionante víamos a chuva ao sul e todas as possibilidades dela nos alcançar. A estrada ia serpenteando pelo alto da serra numa interminável seqüência de sobe e desce com alguns trechos de muito barro, levando nos em direção ao caminho do dia anterior. Com uns 16 km de pedal chegamos na bifurcação do dia anterior em que optamos pela descida mais forte, agora seguimos por um pequeno trecho conhecido até o alto da serra e adentramos novamente pelo desconhecido com a chuva rondando bem perto.

Encontramos pela frente mais de quatro quilômetros em descida os quais saboreamos com muito prazer, mas eu ia atento as estradinhas que se dirigiam ao norte, pois com a chuva rondando comecei a optar em não ir tanto para oeste como pretendia. Avistei uma estradinha que subia por entre os cafezais indo para norte, quando cheguei na bifurcação que levava a ela notei que a mesma adentrava por uma fazenda e no caminho tinha umas pessoas pescando, fui até elas para me informar, pois a situação não permitia certos erros sem risco de seguir um caminho errado e ficar a mercê das chuvas. As pessoas que encontramos não eram do local e não puderam nos ajudar, voltamos para a estrada principal e continuamos para oeste.
A apreensão no peito por ter a chuva tão perto e o desconhecido pela frente só era amenizado pela topografia favorável e a esperança de um trajeto rascunhado e incompleto no GPS ser uma estrada que seguiria para norte. Logo adiante tivemos que parar para trocar as baterias do GPS e aproveitamos para comer, mas sem deixar de ter a chuva bem perto.

Equipamentos e corpos novamente energizados continuamos para logo a frente aquele rascunho no GPS se concretizar em uma possibilidade, se vacilar saímos da principal, logo adiante uma bifurcação criou por instantes alguma dúvida, pois a via da direita ia mais na direção pretendida, só que umas casas ali resolveram esta dúvida, pois estas eram o destino da via da direita, então optamos pela via da esquerda e começamos logo a subir com um piso bastante enlameado, porém com o barro não tão grudento. Dei uma parada no meio da subida para apreciar o visual e eis que avisto a continuação daquela via da direita passando pelas casas e atravessando a serra, eu me enganara e ela era uma opção viável, mas agora com tudo que tínhamos subido, resolvemos seguir em frente, logo a seguir cruzamos com um caboclo que nos confirmou estarmos na estrada certa, mas o barro começou a piorar, o Zé chegou até a fazer um pequeno trecho descendo com a bike nas costas, pois as rodas travaram, por sorte o trecho era pequeno e logo o piso ficou razoável. Mesmo com o tempo nublado e a chuva rondando os visuais eram fantásticos.

Finalmente começamos a descer em direção ao vale onde esperávamos encontrar a estrada que nos levasse para leste e pouca adiante a encontramos, mas uma coisa martelava a minha mente: aquelas duas opções descartadas para atravessar a serra deveriam também chegar nesta estrada. Encontrei alguns possíveis caminhos os quais estão anotados para explorações futuras.

A estrada com pouquíssimas subidas, e quando as tinha eram bem leves, proporcionava uma boa velocidade, por alguns momentos a chuva nos alcançou de leve nos refrescando. Pedalando com vontade cheguei no asfalto já próximo a pousada, onde tinha um bar, comprei uma coca-cola e fiquei esperando pelo Zé, passou-se vários minutos e cheguei a ficar preocupado com a possibilidade dele ter caído em um dos muitos trechos escorregadios, mas ele apareceu na boa e completamos nosso segundo passeio com 45 km.

Diferente dos dois primeiros dias, o sábado amanheceu com sol, nos preparamos mais cedo e partimos para enfrentar a assustadora Serra da Tormenta. Depois de um trecho de rodovia atravessamos a cidade de Carmo do Rio Claro e finalmente começamos a escalar a serra. A primeira marcha já se fez necessária crc0078.jpg (52326 bytes)logo no início da subida que era uma estradinha de terra, algumas centenas de metros depois esta foi substituída por um duplo piso cimentado em cada faixa de rodagem que subia sem descanso, mas mesmo assim não tinha jeito de subir pedalando sem parar e recuperar o fôlego e só 1,3 km depois é encontramos um patamar. Tínhamos subido uns 260 metros neste trecho o que dá uma proporção de 20%, ou seja para cada 10 metros percorrido sobe-se 2 metros, mas o pior ainda estava por vir. No trecho final de uns 600 metros subimos mais de 170 metros o que dá quase 30%, isto na média, pois em alguns trechos isto deve ter passado dos 40%. Então depois de uma hora subindo (incluindo paradas) chegamos ao topo da Serra da Tormenta, "escalando" um desnível de mais de 400 metros em menos de 2 km. IHAAAAAA. Sofrimento a parte, agora é só curtir o visual maravilhoso e investigar uma possível descida por single track.

O single track não achamos, mas consegui ver uma possibilidade de voltar para a pousada por um caminho interessante pela base da serra e depois margeando a represa, então descemos pelo mesmo caminho que subimos e olha que descer dá medo de ficar sem freio, hehehe. Atravessamos a cidade a procura do tal caminho, o qual não foi difícil de achar. Enveredando por entre pequenas fazendas, enfrentando algumascrc0113.jpg (34301 bytes) subidas e uma bela e forte descida chegamos na estrada que margeia a represa, a qual eu já conhecia. Curtimos os últimos quilômetros maravilhados pela paisagem e com um belo dia até a pousada, somando mais 30 km de pedal nas terras mineiras.

Com o corpo e espirito satisfeito resolvemos antecipar a nossa volta e ao anoitecer de sábado estávamos de volta ao lar.

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